ESCOLAS DE LAURO DÃO AULA PRÁTICA DE DEMOCRACIA

“Só existirá democracia no Brasil no dia em que se montar no País a máquina que prepara as democracias. Essa máquina é a da escola pública. ”
Anísio Teixeira.

 

Vinte e três de novembro foi um dia diferente para as escolas da rede municipal de Lauro de Freitas. Toda a comunidade educativa das nossas unidades escolares participou da consulta pública para a escolha de diretores e vice-diretores. Mães, pais, estudantes, professores e demais trabalhadores da educação fizeram filas e aguardaram com paciência cidadã para escolherem as suas candidatas e/ou candidatos.
O processo ocorreu de maneira ordeira, madura e sem sobressaltos em 39 (trinta e nove) das 46 (quarenta e seis) escolas aptas à consulta pelas regras democraticamente definidas, revelando o sucesso absoluto dessa iniciativa. Foi a culminância de um bonito processo que se prolongou por dias de campanhas e grandes expectativas e que terminou nesse belo ambiente colorido, festivo, inteligente, musical e de amplo debate de ideias que transformou as nossas escolas numa grande sala para uma aula magna da democracia.
A consulta pública em Lauro de Freitas, instituída em 2007, foi interrompida de maneira autoritária em 2015, deixando toda a comunidade Laurofreitense indignada. Felizmente, num exemplo para a Bahia e o Brasil, a democracia voltou às nossas escolas e, com coragem, rompemos com métodos autoritários de escolha das/dos dirigentes escolares.
Consideramos que através do processo democrático podemos fortalecer os vínculos de todos com a educação e assim envolve-los ainda mais na participação da tomada de decisão; queremos integrar toda a comunidade de forma mais profunda no dia-a-dia da escola, de modo que todos sintam-se comprometidos com o respeito aos trabalhadores da educação, com a proteção dos nossos estudantes e atuem com mais entusiasmo na luta para melhorar a qualidade do processo de ensino-aprendizagem.
Como uma organização da sociedade, a escola reflete a cultura social, mas, é lógico, ela existe para também influenciar e, mais que isso, transformar essa sociedade. Ao reforçarmos a democracia e o diálogo na escola temos convicção de que influenciaremos positivamente toda a sociedade. Com isso a escola de Lauro de Freitas ensina ao mundo a necessidade do envolvimento de todos para a solução de problemas, reforça a cultura da paz e mostra que a negociação é o melhor caminho para a resolução de conflitos, fortalecendo o senso de democracia em todas as dimensões das nossas vidas.

Às Professoras e professores de Lauro: Educadores do Brasil

                                                                                            “A única arma para melhorar o planeta é a Educação com ética. Ninguém nasce odiando outra pessoa pela cor da pele, por sua origem, ou ainda por sua religião. Para odiar, as pessoas precisam aprender, e se podem aprender a odiar, podem ser ensinadas a amar”. Nelson Mandela.

 

A professora e o professor da nossa rede são potentes alicerces que nos permitem acreditar que estamos construindo um processo educacional consistente, capaz de criar as bases para mudar a nossa cidade, a Bahia, o Brasil e o mundo para melhor. Mais do que nunca precisamos fortalecê-los e destacar sua imprescindível colaboração e seu constante protagonismo.

Há muitas lutas para lutar e obter sucesso. Luta pela valorização. Luta pela qualidade do ensino. Luta por uma cidade efetivamente educadora, com a participação de todos, na efetivação de uma estória de transformação. Não há como esperar que sem a compreensão do verdadeiro significado do papel dos professores sejamos capazes de ir até o topo, alcançando a UTOPIA. Não no seu sentido quixotesco, como muitos imaginam, mas no seu sentido radical, porque de raiz: chegar no ápice da potência humana, totalmente humanizada, como preconizava Nietzsche: HUMANO DEMASIADAMENTE HUMANO.

Demonstrando que a nossa homenagem não é apenas fruto da comemoração de um dia dedicado ao professor/professora, mas sim fruto de uma política sistemática de respeito e valorização do docente, a Prefeita Moema Gramacho tem demonstrado determinação em inaugurar um novo tempo na educação do nosso município, ao tomar medidas avançadas, se destacando dentre os gestores municipais brasileiros.

Nesse sentido, podemos destacar a concessão de contínuos reajustes superiores ao aumento do piso nacional salarial dos professores para toda categoria, o compromisso com as eleições diretas para diretor das unidades escolares, implementando de fato uma gestão democrática nas escolas, o efetivo desbloqueio dos processos administrativos, permitindo que os nossos professores tenham acesso real aos benefícios do seu plano de carreira, que até então não era efetivo na prática, a redefinição de uma política de formação continuada para os professores, além de ações que visam ativar as dimensões educativas dos diversos territórios de Lauro de Freitas, como se faz necessário em uma cidade educadora.

No bojo de uma educação com mais qualidade vale ressaltar três programas que buscam colocar, não só a rede municipal com competência para vivenciar os desafios da contemporaneidade, predominada pela fluidez, como também propiciar aos nossos docentes as ferramentas definidoras de um fazer diferenciado e condizente com o que se espera da educação e do educador: a) o Educadigital que permitirá que todas que as escolas de Lauro de Freitas tenham completo acesso ao contexto tecnológico do Século XXI, por meio de equipamentos e rede de dados que possibilitarão o uso de uma suíte de aplicativos de última geração, com instrumentos de educação presencial e à distância; b) a Educação Integral que permite aos nossos estudantes acesso cada vez maior a processos educacionais dinâmicos e diversos; e em breve, c) a Educação Continuada para trabalhadores da educação, por meio da qual Lauro de Freitas implantará um grande programa de formação para os seus servidores da área, permitindo que seja encaminhada uma transformação curricular com protagonismo de toda a comunidade educativa.

Todas essas iniciativas, aliadas à competência de nossos docentes, fartamente comprovada por meio de prêmios nacionais obtidos, conduzem-no a certeza de que todas as homenagens e louros são infinitamente menores do que é capaz nossa forma verbal de expressar o que efetivamente representam os professores e professoras de Lauro de Freitas.

Feliz Dia das Professoras!

Feliz Dia dos Professores!

 

Com estima,

Paulo Gabriel Soledade Nacif

Secretário Municipal de Educação

UFRB, treze anos: “E o Recôncavo, e o Recôncavo, e o Recôncavo meu medo”

Paulo Gabriel Soledade Nacif

O ano de 2022 marca o bicentenário da independência do Brasil e é certo que esse marco, principalmente para os baianos – mas não só para eles, se estende e tem o seu ápice em 02 de julho de 2023, data do bicentenário da expulsão  das forças  portuguesas da Bahia, último bastião dos colonizadores. É consenso que sem essa ação dos baianos, notadamente do Recôncavo, o Brasil tenderia a se desintegrar em vários países, como ocorreu com a América Espanhola. É, portanto, um absurdo que o senhor Michel Temer tenha expedido, em 06 de setembro de 2016, um decreto que Institui a “Comissão Interministerial Brasil 200 Anos” para organizar o bicentenário da independência do Brasil e colocado como data para o encerramento dos trabalhos dessa comissão 01 de março de 2023, demonstrando descaso ou desconhecimento com a história do povo brasileiro.

Essa ação do Governo Federal não pode passar despercebida pelo povo do Recôncavo e da Bahia. Até o momento não vimos nenhuma ação das instituições e movimentos sociais contra esse ato que simbolicamente nos exclui das comemorações oficiais da independência do Brasil – ao menos naquilo que é mais caro para nós.

Começo esse texto com esse fato, porque me parece que isso retrata bem o momento em que a UFRB, maior conquista do povo do Recôncavo nesse século, completa treze anos ( http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_Ato2004-2006/2005/Lei/L11151.htm ). Um momento em que estamos nos movimentando timidamente frente ao golpe e seus múltiplos desdobramentos.

Recentemente participei, em Santo Antônio de Jesus, de um grande ato político com as principais lideranças políticas da Bahia e do Recôncavo e me chamou a atenção o fato de que a UFRB não foi citada uma única vez pelas principais forças políticas presentes – justamente aquelas que estiveram ao nosso lado na conquista e consolidação da universidade. É certo que vivemos um momento em que os políticos se colocam distantes dos debates culturais e preferem uma excessiva ênfase na infraestrutura física, mas será que só isso explica esse silêncio?

No dia  25 de junho de 1822, reunidos na Câmara Municipal de Cachoeira, lideranças do Recôncavo anunciam o resultado da consulta feita ao povo: se concordava que se proclamasse dom Pedro de Alcântara regente constitucional e defensor perpétuo do Brasil. Mesmo sob ameaça da armada portuguesa, fundeada no Rio Paraguaçu, a resposta foi “Sim!”. Por esse ato Cachoeira recebeu o Título de “Cidade Heroica”, por meio da Lei Provincial no. 43 de 13 de março de 1837. Por uma ação do Governador Jaques Wagner e por grande esforço do historiador Ubiratan Castro e da Senadora Lídice da Mata,  está prevista na Lei 10.695/07,  que em 25 de junho a sede do governo da Bahia seja transferida para Cachoeira, por 24 horas. Durante seus primeiros anos essa data passou a ser  ponto de confluência das forças culturais e políticas de toda a Bahia e do Brasil.  Hoje, 25 de junho em Cachoeira está voltando a ser uma data quase municipal.

Esses exemplos estão aqui porque por tudo que somos e pelo tamanho que atingimos precisamos nos colocar em posição central nessa discussão. Não podemos nos abster de liderar institucionalmente os grandes debates sobre o Recôncavo sob pena de respondermos historicamente por essa omissão.

Como silenciar sobre a paralisação do Estaleiro de Maragogipe? Qual a nossa posição sobre a Ponte Salvador-Itaparica e a duplicação da rodovia Bom Despacho/Santo Antônio de Jesus? Desejamos a federalização do hospital regional de SAJ? Quais os impactos da reforma da educação básica e da BNCC nas nossas escolas? Como está o “currículo Recôncavo” nessas escolas? Qual o nosso papel na salvaguarda do patrimônio material e imaterial do Recôncavo? São questões que uma universidade que se autodenomina imbricada no Recôncavo não pode se abster. E, vale lembrar aos pragmáticos de plantão, essas ações podem ser as fontes de recursos que precisamos principalmente em momentos de crises.

Lembro que discutimos a criação de uma Agência de Desenvolvimento do Recôncavo, como uma ação complementar que permitiria à UFRB se constituir mais e mais numa “multiversidade”, justamente para promover estudos e propostas de políticas públicas sobre questões como essas. O apoio de ministérios como o da Cultura e Transportes e a Petrobrás a esse projeto de Agência de Desenvolvimento contribuiu para que o MEC, inclusive, disponibilizasse mais cargos de direção para a UFRB em relação às outras instituições criadas no mesmo período que nós. Com o tempo, estabelecemos outras prioridades e desistimos desse caminho.

Somos uma liderança consolidada e reconhecida pelos pares para estabelecer instrumentos capazes de congregar a UFBA, a UNEB, a UNILAB, o IFBA, o IFBAIANO e a UEFS em torno de projetos para o Recôncavo por meio de propostas como essa Agência que ficou no meio do caminho. São sete instituições públicas de ensino superior no entorno da baía que por muito tempo foi o centro real do Império Português. Excluindo-se Salvador, essas instituições possuem quinze campi nessa região histórica e é razoável considerar que a UFRB deve se responsabilizar pela articulação entre elas para o desenvolvimento de ações conjuntas sobre o Recôncavo.

Esse sentimento do Recôncavo como um lugar especial, de ancestralidade, da diversidade cultural, da “pedra pisada de preto, luso, banto, sudanesa”, do lugar do povo que efetivamente construiu o Brasil “e ainda produziu milagres de fé no extremo ocidente”, não pode se esvair do nosso projeto institucional. Assumimos desde sempre um lugar de uma universidade regional, mas estamos nos distanciando dos  exemplos institucionais desses modelos de universidade. O nosso projeto civilizatório precisa ter uma base local e isso precisa ser retratado em ações institucionais profundas.

Não devemos nos conformar, como em muitas universidades, em uma estrutura que deixa esses esforços, de forma relativamente dispersa, aos seus professores, técnicos-administrativos e estudantes, relegando às instâncias coletivas superiores um papel secundário e, portanto, incapazes de articular essas ações.

Há pouco tempo, no início da nossa história, conseguimos contaminar as instâncias de poder de amplo espectro ideológico sobre o papel estratégico que poderíamos desempenhar no Recôncavo e a nossa existência passou a ser a garantia para inúmeras ações nesse território. Precisamos assumir mais e mais essa posição e não nos afastar dela: O nosso desafio tem que ser a busca pela transformação radical do nosso lugar, assumindo que o local protópico criado e transformado poderá servir de inspiração para a transformação em outros locais.

Fizemos e continuamos fazendo muito, mas precisamos assumir que institucionalmente precisamos fazer mais. Esse é o nosso compromisso pétreo com o povo do Recôncavo, tomado no nosso projeto constitutivo como o território de aprendizagem da universidade que nascia. Sem isso, por mais que façamos, será inexorável que se consolide um efetivo desencantamento do Recôncavo com a nossa instituição. Precisamos evitar que isso aconteça reinventando a nossa relação com esse território.

Lembro que certa vez, reunido com Gilberto Gil e Dona Canô em Santo Amaro, ele me disse: “não se entende o Brasil sem se entender a Bahia, não se entende a Bahia sem se entender o Recôncavo, logo, para entender o Brasil é necessário entender o Recôncavo.” Se Gil está certo, e eu aposto que ele está, precisamos nos colocar na posição de quem tem como trabalho traduzir o Recôncavo para todos os que querem entender o Brasil.  Precisamos dar exemplo de como a luta contra o retrocesso sociopolítico e cultural pode ser exercida dentro de uma universidade cujo sonho de existência foi o mais contra-hegemônico em toda a história do Brasil, justamente por ela estar aqui e carregar o nome da sua cara, o nome da sua carne: Federal do Recôncavo!